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100 Cartas para Paulo Freire de quienes pretendemos Enseñar

 | 
Francisco Gárate Vergara

1. Experiencias y transformación

Provoc-ação ao diálogo, por escrito

Ana Lúcia Souza De Freitas

Texte intégral

1Querido professor Paulo Freire

2Escrevo esta Carta Pedagógica dedicada à tua memória, presença sempre viva nas experiências de todas, todos e todes que compreendem e exercem a educação como forma de intervenção no mundo. Emprego a segunda pessoa, próxima e amorosamente, como se fôssemos velhos amigos, pois é assim que sinto nossa relação, apesar de presencialmente ter te encontrado apenas uma vez. Foi aqui em Porto Alegre, no ano de 1995. Naquele momento, eu não podia imaginar quão presente te tornarias na minha formação, nem compreender a intensidade dos diálogos exercidos, mesmo que de modo indireto, por meio das leituras de tuas obras.

3Esta é a primeira carta que te escrevo, somando-me a tantas outras que vens recebendo neste ano em que celebramos o centenário de teu nascimento. Somos muitos e muitas para quem tua vida e obra estão sendo referências indispensáveis para produzir a boniteza de ensinar num cenário de luta ideológica cada vez mais acirrada, na qual teu nome representa o sentido da transformação social que buscamos construir. Como bem esclareces

Devo concluir esta questão dizendo que os educadores progressistas sabem muito bem que a educação não é a alavanca da transformação da sociedade, mas sabem também o papel que ela tem nesse processo. A eficácia da educação está em seus limites, Falamos deles precisamente porque, não podendo tudo, pode alguma coisa. A nós, educadores e educadoras de uma administração progressista, nos cabe ver o que podemos fazer para competentemente realizar ().
Freire, 1991, p. 30

4Pelas tantas homenagens e cartas já recebidas, imagino que estejas ciente dos tempos difíceis que estamos vivendo neste contexto da pandemia da Covid-19. Nas escolas e universidades, o ensino remoto vem evidenciando, entre outros aspectos, a desigualdade das condições de acesso a recursos para realizar a dinâmica do trabalho pedagógico. Mas também é importante destacar que teu legado está cada vez mais servindo de referência para reinventar as práticas educativas diante destas circunstâncias. Por isso te escrevo com o desejo de tornar pública esta reflexão, buscando também dialogar com educadoras e educadores que ousam ensinar, sem dissociar a leitura do mundo e a leitura da palavra.

5Pretendo compartilhar brevemente as Andarilhagens de uma educadora pesquisadora (Freitas, 2020), cujos percursos foram ao mesmo tempo produto e produtores do movimento de Leituras de Paulo Freire que se realiza desde o sul do Brasil. Assim, esta é também uma forma de agradecimento, inspirada por uma instigante pergunta que me foi feita recentemente: “Ana Lúcia, se pudesse sentar com Paulo Freire hoje, o que gostaria de conversar com ele a partir da dimensão que as Cartas tomaram em sua obra?”. A curiosidade ocorre justamente no contexto da pandemia, no qual as experiências que reinventam o pensamento de Paulo Freire em diferentes contextos educativos vêm ganhando crescente visibilidade. De modo inesperado, a intensidade das atividades virtuais realizadas estabeleceram conexões anteriormente não imaginadas, produzindo e disponibilizando conteúdo e conhecimento sobre diversos temas, entre eles, as Cartas Pedagógicas.

6Diante da pergunta, foi inevitável olhar para trás, fazendo memória do modo como as leituras de Paulo Freire se tornaram referência na minha formação pessoal e profissional. De modo especial, refletindo sobre como, em experiência docente no ensino superior, venho empregando as Cartas Pedagógicas como instrumento de formação em diferentes contextos de ensino, pesquisa, extensão e gestão. Considerando os limites desta carta, organizei duas sequências de imagens para recuperar o processo vivido e, na continuidade, propor o diálogo sobre o potencial teórico-metodológico das Cartas Pedagógicas.

Sequência 01: O encontro com a Pedagogia da Esperança

Sequência 01: O encontro com a Pedagogia da Esperança

Fonte: Elaborado a partir de acervo pessoal.

7No ano de 1995, vieste a Porto Alegre para participar do evento A Educação Popular morreu?, organizado pela Secretaria Municipal de Educação (SMED). À época, eu trabalhava na assessoria pedagógica da SMED e embora não fizesse parte do grupo que te acompanhou diretamente, contribuí para registrar aquele significativo momento. Configurou-se assim uma inesperada aproximação! Importa destacar que fotografar eventos não era uma prática tão comum como hoje em dia. Fotografar era oneroso, pois além da aquisição de uma máquina fotográfica, era inevitável o custo do filme e da revelação. Mas eu sempre tive o gosto por registrar momentos especiais; então, por uma feliz circunstância, fui uma das responsáveis pelo registro daquele encontro da assessoria contigo, no Ginásio Tesourinha em Porto Alegre.

8Este foi nosso único encontro presencial, uma experiência bastante significativa, cujos registros são memoráveis. Naquela oportunidade, aproveitei para pedir - apesar da vergonha - um autógrafo no meu exemplar da Pedagogia da Esperança (Freire, 1992), leitura realizada poucos anos antes, que continuava me impactando e servindo de referência para o trabalho de formação com as equipes diretivas das escolas. Do evento em si, guardo a lembrança do barulho da chuva, cuja força num determinado momento provocou um impactante silêncio em que tua presença, mais do que as palavras, dizia o valor do diálogo freireanamente exercido.

9Na continuidade, tua experiência de “Mudar a cara da escola” em São Paulo (Freire, 1991) referenciou o trabalho de formação continuada com as equipes diretivas quanto ao processo de reinvenção da escola, na perspectiva da educação popular. A significativa leitura da Pedagogia da Esperança, já referida, deflagrou a curiosidade epistemológica que me levou de volta à universidade, tomando a experiência da Escola Cidadã em Porto Alegre como objeto de investigação. Não vou me alongar a respeito, mas este foi o ponto de partida do ato crítico de estudar, tomando a práxis freireana como referência e realizando pesquisas que envolveram a produção de Cartas Pedagógicas.

10Minha primeira experiência com Cartas Pedagógicas no âmbito da formação acadêmica foi em dezembro de 2000, ano em que foi publicada a obra Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos (Freire, 2000). Nesta época, eu vivia um intervalo na minha experiência de pesquisa entre os cursos de mestrado e o doutorado – trabalhava na SMED de Porto Alegre e também como docente e pesquisadora no Centro Educacional La Salle (hoje Unilasalle), participando do Projeto Sonho Possível, vinculado ao Núcleo de Educação Popular (NUPEP). No contexto de investigação com uma escola lassalista recentemente criada, organizada por ciclos de formação, convidamos os/as professores/as a participar de uma oficina de pesquisa para a produção de Cartas Pedagógicas. Esta foi uma significativa experiência cuja continuidade integrou a investigação do Doutorado, realizado entre 2001 e 2004. Desde então, as Cartas Pedagógicas vêm sendo reinventadas em minhas andarilhagens de educadora pesquisadora no ensino superior, incentivando e orientando a produção escrita autoral dos e das estudantes, articulando ações de ensino, pesquisa, extensão e gestão.

11Faz sentido o que estou dizendo, tão rapidamente, sobre um período tão longo? Nos limites desta escrita, a sequência de imagens a seguir retrata a riqueza das interações exercidas.

Sequência 02: Cartas Pedagógicas: experiência e reinvenção

Sequência 02: Cartas Pedagógicas: experiência e reinvenção

Fonte: Elaborado a partir de acervo pessoal.

12A intenção é enfatizar que foi no percurso da experiência continuada, orientada pelos estudos freireanos e em diálogo com outros autores e autoras, que a proposição inicial da oficina de pesquisa para a produção de Cartas Pedagógicas veio sendo reinventada, em articulação com experiências em diferentes contextos de formação. Assim, muitas e significativas parcerias fazem parte e seguem compartilhando desafios e autorias. Espero que a incompletude deste relato desperte a curiosidade e mobilize à continuidade do diálogo.

13Querido Freire, ao finalizar, retomo a finalidade anunciada no subtítulo: “provoc-ação ao diálogo, por escrito”. Ouso convidar para o compartilhamento da reflexão sobre o potencial teórico-metodológico da expressão Cartas Pedagógicas, criada por Paulo Freire. Penso ser esta uma questão relevante considerando as possibilidades de fazer da escrita uma forma de esperançar e de semear a boniteza de ensinar em tempos de pandemia. Por isso, sugiro: vamos seguir dialogando a este respeito? Vamos ampliar conexões entre experiências? Vamos dar continuidade ao compartilhamento de Cartas Pedagógicas?

14Despeço-me, como de costume, deixando um forte abraço freireano! Desta vez, curiosa quanto à leitura de outras cartas a ti endereçadas e com uma ampliada expectativa quanto à continuidade do diálogo.

Referências

Bibliographie

De Freitas, A. (2020). Andarilhagens de uma educadora pesquisadora: Cartas Pedagógicas e outros registros de participação no Fórum de Estudos Leituras de Paulo Freire. – São Paulo: BT Acadêmica; Porto Alegre: Poiesis & Poiética Casa Publicadora.

Freire, P. (1991). A Educação na Cidade. São Paulo: Cortez.

Freire, P. (1992). Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra.

Freire, P. (2000). Pedagogia da Indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: UNESP.

Table des illustrations

Titre Sequência 01: O encontro com a Pedagogia da Esperança
Légende Fonte: Elaborado a partir de acervo pessoal.
URL http://books.openedition.org/ariadnaediciones/docannexe/image/12575/img-1.jpg
Fichier image/jpeg, 28k
Titre Sequência 02: Cartas Pedagógicas: experiência e reinvenção
Légende Fonte: Elaborado a partir de acervo pessoal.
URL http://books.openedition.org/ariadnaediciones/docannexe/image/12575/img-2.jpg
Fichier image/jpeg, 23k

Auteur

Unipampa, Campus Jaguarão Coletivo Leitoras de Paulo Freire na França Brasil

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